2024-07-16
Por Rainer Zitelmann
O termo "capitalismo" é muitas vezes associado à ideia de ganância desenfreada e de interesse privado acima do "bem comum", mas será mesmo assim? Neste artigo, o historiador e sociólogo Rainer Zitelmann responde à ideia de que é o capitalismo que promove o egoísmo no espírito humano, assinalando que todos os empresários precisam de empatia para obterem sucesso no mercado, e alertando para as derivas totalitárias da primazia do "bem comum".
O economista britânico Paul Collier compilou uma série de propostas sobre como o capitalismo deveria ser “reformado”. Critica o “défice moral” que o “capitalismo moderno” enfrenta e afirma que a ideia de que “a ganância é boa” – o lema de Gordon Gekko no filme Wall Street de 1987 – é a máxima deste capitalismo moderno, e que por isso o capitalismo precisa urgentemente de uma correção ética.
Em 2020, Collier escreveu o livro Greed Is Dead [“A Ganância Morreu”] em coautoria com o seu colega britânico John Kay, e nele pintam um quadro tendencioso de um capitalismo dominado pelo “fundamentalismo de mercado” e pelo “individualismo”: «Os mercados não são vistos como mecanismos de troca mutuamente benéficos, mas sim como lugares onde as pessoas tentam enganar-se umas às outras em benefício próprio.» Com o capitalismo do século XXI tão fora dos eixos, Collier acredita que a solução está em fazer regressar o conceito de “interesse público” ao centro da vida económica e exigir que as empresas se alinhem com o “interesse público” e não apenas com a procura de lucro.
Collier quer que os cidadãos desempenhem o papel de “polícias” que vigiam as empresas para garantir que elas estão a agir de acordo com o interesse público. Não está a propor que um corpo de intervenção estatal, mas sim ativistas automandatados, que ninguém legitimou, espiem e controlem as empresas. «A regulação pode ser subvertida através de um conjunto de ações cirúrgicas: os impostos podem ser reduzidos através de contabilidade engenhosa; os mandatos podem ser adulterados através de um raciocínio fundamentado. A única defesa para este tipo de ações é uma força policial omnisciente… Este suave papel de fiscalização não exige que toda a gente o desempenhe: há uma massa crítica de participantes acima da qual os riscos decorrentes de uma ação dolosa da empresa são demasiado elevados para suportar.»
Precisamos mesmo de espiões, informadores e de uma “polícia que tudo vê” para "melhorar" o capitalismo? Serão a ganância e o egoísmo desenfreado – e hoje mais do que nunca – as forças motrizes do capitalismo? O interesse próprio de cada ser humano é um impulsionador, embora certamente não o único, de toda a ação humana. Mas isso nada tem a ver com um determinado sistema económico.
As ideologias totalitárias procuram diminuir o “Eu”. Desejam precisamente subordiná-lo ao “Nós”, como o demonstram duas das máximas do nacional-socialismo: “Du bist nichts, dein Volk ist alles” (“Tu não és nada, o teu Povo é tudo”) e “Gemeinwohl vor Eigenwohl” (“O interesse comum antes do interesse privado”). Num discurso em novembro de 1930, Adolf Hitler disse: “Em toda a esfera da vida económica, e até em toda a própria vida, ter-se-á de pôr de lado a ideia de que o benefício do indivíduo é o essencial e de que o benefício do coletivo é construído sobre o benefício do indivíduo, ou seja, que é o benefício do indivíduo que dá origem ao benefício do coletivo. O contrário é que é verdade: o benefício do coletivo determina o benefício do indivíduo… Se este princípio não for reconhecido, o egoísmo vai inevitavelmente instalar-se e dilacerar a comunidade.»
Adam Smith enfatizou os benefícios do egoísmo, salientando, não o puro interesse próprio, mas precisamente o facto de as pessoas precisarem constantemente da ajuda umas das outras. No entanto, também salientou o facto de que ninguém pode contar apenas com a boa vontade dos outros: «[O homem] terá maior probabilidade de alcançar o que deseja se conseguir interessar o egoísmo [dos seus congéneres] a seu favor e convencê-los de que terão vantagem em fazer aquilo que ele deles pretende… Não é da bondade do homem do talho, do cervejeiro ou do padeiro que podemos esperar o nosso jantar, mas da consideração em que eles têm o seu próprio interesse. Apelamos, não para a sua humanidade, mas para o seu egoísmo [self-love], e nunca lhes falamos das nossas necessidades, mas das vantagens deles.»
O egoísmo foi sempre uma característica humana, mas, no capitalismo, encontra-se restringido pelo facto de o sucesso só estar ao alcance do empresário que se foque primordialmente nas necessidades dos clientes. É a empatia, e não a ganância, que serve de base ao capitalismo. A empatia é a capacidade de reconhecer e compreender os sentimentos e os motivos de outra pessoa. E esta é a qualidade mais importante dos empreendedores de sucesso. Tomemos o exemplo de Steve Jobs. Ele inventou produtos como o iPhone porque compreendeu melhor do que outros as necessidades e os desejos das pessoas na sociedade moderna. O mesmo se diga de Mark Zuckerberg, hoje uma das pessoas mais ricas do mundo. Inventou o Facebook porque percebeu, melhor do que outros empresários, a vontade dos seus contemporâneos de comunicarem através da Internet. Steve Jobs e Mark Zuckerberg alcançaram o êxito – como todos os empresários de sucesso – através dos seus clientes.
O autor aprofunda estes e outros argumentos a respeito da relação entre capitalismo e ganância no sétimo capítulo do seu livro Em Defesa do Capitalismo: um Antídoto para os Mitos Anticapitalistas, publicado pelo Instituto Mais Liberdade em parceria com a editora Alêtheia.
Instituto +Liberdade
Em defesa da democracia-liberal.
info@maisliberdade.pt
+351 936 626 166
© Copyright 2021-2024 Instituto Mais Liberdade - Todos os direitos reservados