Economia, Excertos e Ensaios, Liberalismo e Capitalismo, Governo, Finanças Públicas e Tributação
O rédito privado dos indivíduos, mostrou-se no primeiro livro deste Inquérito, resulta em última análise de três fontes diferentes: Renda, Lucro e Salários. Todos os impostos devem finalmente ser pagos de uma ou outra dessas três diferentes espécies de rédito, ou de todas indiferentemente. (...) Muitos desses impostos – ressaltará da análise seguinte – não são finalmente pagos do fundo, ou fonte do rédito, sobre que se destinavam a recair.
Antes de entrar na análise de impostos especiais, torna-se necessário referir as quatro máximas seguintes no que toca aos impostos em geral.
I. Os súbditos de todos os Estados devem contribuir para a manutenção do governo, tanto quanto possível, em proporção das respectivas capacidades, isto é, em proporção do rédito que respectivamente usufruem sob a protecção do Estado. A despesa do governo para os indivíduos de uma grande nação é semelhante à despesa de administração para os co-arrendatários de uma grande herdade, obrigados a contribuir na proporção dos seus respectivos lucros na herdade. Na observância ou não dessa máxima consiste o que se chama a igualdade ou desigualdade de tributacão. (...)
II. O imposto que todo o indivíduo é obrigado a pagar deve ser certo e não arbitrário. O tempo de pagamento, o modo de pagamento, o quantitativo a ser pago, tudo deve ser claro e simples para o contribuinte e para todas as outras pessoas. Caso contrário, todas as pessoas sujeitas ao imposto são colocadas, mais ou menos, sob a alçada do cobrador de impostos, que ou pode agravar o imposto a um contribuinte desagradável, ou extorquir, pelo terror de tal agravamento, algum presente ou gratificação. A incerteza da tributação estimula a insolência e favorece a corrupção de uma classe de homens naturalmente impopulares, mesmo que não sejam nem insolentes, nem corruptos. A certeza do que cada indivíduo deve pagar é, na tributação, um assunto de tão grande importância que, parece, um grau considerável de desigualdade (creio-o pela experiência) não constitui de perto um mal tão grande como um pequeno grau de incerteza.
III. Todo o imposto deve ser lançado no tempo ou modo mais provável de ser conveniente para o contribuinte o pagar. Um imposto sobre a renda da terra ou das casas, pagável no mesmo prazo em que tais rendas são geralmente liquidadas, é lançado na altura em que é mais provável de satisfazer as conveniências do contribuinte; ou, quando ele tem mais probabilidades de ter com que pague. Os impostos sobre tais bens de consumo como artigos de luxo são finalmente pagos pelo consumidor e geralmente de um modo que lhe é muito conveniente. Paga-os aos poucos, quando tem ocasião de comprar os bens. Como também tem liberdade de comprar ou não, como lhe aprouver, a culpa é toda dele se acaso sofrer qualquer inconveniência considerável devido a tais impostos.
IV. Todo o imposto deve ser arquitectado tão bem que tire o mínimo possível do bolso das pessoas para além do que traz para o erário público. Um imposto pode tirar ou afastar do bolso das pessoas muito mais do que arrecada para o tesouro público das quatro maneiras seguintes. Em primeiro lugar, o seu lançamento poderá requerer um grande número de oficiais cujos ordenados podem consumir a maior parte do produto do imposto e cujos emolumentos podem impor outra taxa adicional sobre o povo. Em segundo lugar, pode obstruir a iniciativa das pessoas e desencorajá-las de se aplicarem em certos ramos de negócio que poderiam garantir sustento e emprego a grande número de pessoas. Enquanto obriga as pessoas a pagar, pode deste modo diminuir ou talvez destruir alguns dos fundos que poderiam proporcionar-lhes a fazer tal. Em terceiro lugar, pela confiscação e outras sanções em que incorrem esses infelizes, tentando, sem êxito, evadir-se dos impostos, pode muitas vezes levá-los à ruina, e desse modo acabar com o benefício que a comunidade poderia ter recebido do investimento dos seus capitais. Um imposto pouco judicioso oferece uma grande tentação para a fraude. Mas as sanções para a fraude devem aumentar na proporção da tentativa. A lei, contrária a todos os princípios da justiça, cria primeiro a tentação e depois pune aqueles que a ela cedem. Geralmente encarece a punição em proporção com a própria circunstância que deve certamente aliviá-la – a tentação de cometer o crime. Em quarto lugar, ao sujeitar o povo a frequentes inspecções e ao exame odioso dos cobradores de impostos, pode expô-lo a desnecessárias dificuldades, vexames e opressões. E embora o vexame não seja, rigorosamente falando, uma despesa, é certamente equivalente ao custo pelo qual todo o homem estaria disposto a redimir-se dele. É numa ou noutra destas quatro diferentes maneiras que os impostos são frequentemente mais onerosos para as pessoas do que benéficos para o soberano.
A utilidade e justiça evidentes das máximas anteriores têm mais ou menos sido recomendadas à atenção de todas as nações. Todas as nações têm procurado esforçar-se o máximo para apresentar os seus impostos tão equitativamente quanto conseguiram concebê-los. Tão certos como convenientes para o contribuinte, não só no tempo como no modo de pagamento e em proporção com o rédito que levaram ao príncipe. E o menos oneroso possível para o povo. A curta análise seguinte de alguns dos principais impostos que se verificaram em diferentes épocas e países mostrará que os esforços de todas as nações não foram a esse respeito igualmente bem sucedidos.
Excertos do Capítulo II, Livro V, do clássico Inquérito sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações (1776), obra magna do pensador escocês Adam Smith (1723-1790), considerada por muitos o texto fundacional da ciência económica.
A presente tradução, publicada pela Fundação Calouste Gulbenkian, esteve a cargo de Teodora Cardoso e Luís Cristóvão de Aguiar, e baseou-se na edição levada a cabo pelo economista britânico Edwin Cannan (1861-1935), nascido no Funchal. Para uma leitura ainda mais completa, sugerimos a consulta das suas também famosas notas editoriais, acessíveis através da nossa biblioteca.
Narração: Mário Redondo.
Edição: Pedro Almeida Jorge e Nuno Quintão.
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