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2023-05-03

Por Alexandra Abreu

"O dilema da habitação"

Artigo classificado em 1.º lugar no Concurso de Ideias +Liberdade sobre a crise da habitação em Portugal

Nas últimas décadas, muito por culpa da burocracia imposta pelo Estado, assistiu-se a um decréscimo muito acentuado na construção, essencialmente no mercado habitacional. Assim, o aumento da procura, face aos imóveis disponíveis para habitação existentes no mercado (tanto para venda, como para arrendamento), resultou no aumento nos preços nestes dois mercados, devido à pouca oferta face à muita procura.

Nesse sentido, e tendo presente a necessidade de criar, urgentemente, mais oferta no mercado habitacional, tanto para venda, como para arrendamento, uma das soluções deverá passar pela conversão de lojas e ateliers, que atualmente detêm licença para comércio e serviços, em habitação, adquirindo estes espaços licença de utilização para habitação.

Senão, vejamos: existem por todo o país largas centenas, ou mesmo milhares de prédios que no rés-do-chão têm no mínimo uma ou duas lojas, muitas destas nunca foram arrendadas/utilizadas uma única vez, por não existir mercado (procura) para as mesmas. O mesmo sucede-se com os ateliers, muitos deles já utilizados como habitação, mas de forma ilegal, ou seja, estes imóveis são arrendados sem um contrato de arrendamento válido, devido a não terem a licença de utilização para habitação, não sendo possível ao senhorio emitir o respetivorecibo de renda e consequentemente o inquilino não pode deduzir a despesa como renda no IRS. Acresce ainda que estes imóveis não podem ser transacionados como habitação, uma vez que, devido a não terem a licença de utilização para habitação, apenas podem ser adquiridos por empresas ou empresários em nome individual, pagando a pronto ou recorrendo a leasing imobiliário e, como tal, não podem ser adquiridos com recurso ao crédito à habitação.

Deste modo, convertendo e colocando as lojas e os ateliers no mercado como habitação, a oferta iria aumentar, seria somente necessário adaptar estes imóveis já existentes em habitação e, assim, conferir aos mesmos a licença de utilização para o referido fim. Para o efeito, teria de se proceder à simplificação do licenciamento destes espaços destinados a comércio e serviços, bastando para tal que os proprietários dos imóveis requeressem junto da autarquia, onde se localiza o imóvel, a alteração da licença de utilização do mesmo, juntando a aprovação do condomínio por maioria simples e as respetivas declarações técnicas emitidas por engenheiros, tanto da parte elétrica como da parte sanitária, para que a respetiva câmara municipal emitisse a licença de utilização para fins habitacionais. Estes imóveis passavam assim a estar afetos à habitação para todos os efeitos legais, inclusive junto da Autoridade Tributária, bem como a nível de registo na Conservatória do Registo Predial.

Quanto às lojas com fachada para a rua, apenas teriam de observar e respeitar a arquitetura já existente no restante edifício, respeitando as dimensões e materiais das janelas dos restantes apartamentos. Quanto ao interior, bastava ter em consideração as tipologias já existentes, face às áreas que cada imóvel detenha, sendo de dispensar o pedido de licença para obras, ou parecer técnico, uma vez que estas obras não interferem na estrutura do prédio, apenas nas fachadas. De realçar que, relativamente às obras no interior dos imóveis, já se encontra dispensado o pedido de licença para obras ou qualquer outro parecer técnico, em virtude de não haver alterações estruturais no prédio, bastando os referidos pareceres técnicos.

Desta forma, atendendo ao número de lojas disponíveis/desocupadas, os seus proprietários, que assim pretendessem, poderiam requerer a conversão destes imóveis em habitação, através deste procedimento simplificado, realizando as obras necessárias e solicitando no respetivo município a conversão do seu espaço comercial em habitação, para o poder colocar no mercado habitacional, tando para venda como para arrendamento. 

Com esta medida relativamente simples, aproveitando centenas de imóveis que se encontram disponíveis no mercado para comércio e sem relevante procura, e atendendo à enorme procura no mercado habitacional, a conversão destes espaços comerciais em habitação permitiria, num curto espaço de tempo, adicionar muito mais habitações disponíveis, tanto no mercado de arrendamento como para venda.

De destacar ainda que, devido às lojas se situarem ao nível do rés-do-chão, algumas pessoas, por questões de segurança, não demonstram muito interesse nos imóveis, o que levaria a um custo ainda mais acessível destes imóveis, podendo ser uma solução mais interessante para quem procura uma habitação a um preço mais competitivo.

Alexandra Abreu

(FCT NOVA - Engenharia do Ambiente)

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