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Sobre "A Lei" de Bastiat

Walter E. Williams , Frédéric Bastiat

Filosofia, Ética e Moral, Filosofia Política, Direito e Instituições, Direitos Civis e Privacidade, Liberalismo e Capitalismo

Português

Já devia ter à volta de quarenta anos quando li pela primeira vez o clássico de Frédéric Bastiat, A Lei. Um desconhecido, a quem ficarei eternamente grato, enviou-me pelo correio uma cópia não solicitada. Depois de ler o livro, fiquei convencido de que uma educação nas artes liberais sem um encontro com Bastiat deve considerar-se incompleta. Ler Bastiat fez-me aperceber de todo o tempo que desperdicei, envolto nas frustrações de sucessivos becos sem saída, a organizar a minha filosofia de vida. No meu caso, mais do que uma conversão filosófica, A Lei introduziu ordem no meu pensamento sobre liberdade e integridade.

Diversos filósofos contribuíram de forma relevante para o discurso sobre a liberdade, entre eles Bastiat. Mas a maior contribuição de Bastiat foi tirar o discurso da torre de marfim e tornar as ideias sobre a liberdade tão claras que até os iletrados as conseguem entender e nem os estatistas as conseguem ofuscar. A clareza é crucial para persuadir os nossos pares da superioridade moral da liberdade individual.

Como outros, Bastiat reconheceu que a maior ameaça à liberdade é o governo. Repare-se na clareza que ele emprega para nos ajudar a identificar e entender atos malignos do governo, como a espoliação legal. Bastiat diz: “É preciso examinar se a Lei toma a uns o que lhes pertence para dar a outros o que não é deles. É preciso examinar se a Lei pratica, em benefício de um cidadão e em detrimento de outros, um acto que este cidadão não poderia praticar sem com isso cometer um crime.” Com uma descrição tão precisa da espoliação legal, não há como negarmos a conclusão de que a maioria das atividades do governo, inclusive o nosso, constituem, na verdade, uma espoliação legal ou, em termos mais modernos, um roubo legalizado.

Frédéric Bastiat poderia facilmente ter sido um companheiro de viagem dos signatários da nossa Declaração de Independência. A visão dos signatários sobre a liberdade e sobre a esfera adequada do governo foi cristalizada nas seguintes palavras imortais: “Consideramos estas verdades como evidentes por si mesmas, que todos os homens são criados iguais, dotados pelo Criador de certos Direitos inalienáveis, que entre estes estão a Vida, a Liberdade e a procura da Felicidade. Que, a fim de assegurar esses direitos, Governos são instituídos entre os Homens...” Bastiat ecoa a mesma visão, dizendo: “Existência, Faculdades, Assimilação – por outras palavras, Personalidade, Liberdade, Propriedade – eis o Homem. São estas três coisas das quais se pode dizer, sem qualquer subtileza demagógica, que são anteriores e superiores a toda a legislação humana.” Tal como fizeram os nossos Fundadores, Bastiat aplicou a mesma lógica ao governo, dizendo: “Não é por os homens terem promulgado leis que a Personalidade, a Liberdade, e a Propriedade existem. Pelo contrário, é porque a Personalidade, a Liberdade, e a Propriedade preexistem que os homens fazem leis.” Nunca os direitos naturais ou concedidos por Deus foram mais elegantemente proclamados do que na nossa Declaração de Independência e n’A Lei.

Bastiat depositou nos Estados Unidos as suas esperanças pelo futuro da liberdade, dizendo: “Ponham os olhos nos Estados Unidos. É o país do mundo onde a Lei melhor se mantém no seu papel, que é o de garantir a cada um a sua liberdade e a sua propriedade. Também é o país do mundo onde a ordem social parece apoiada em bases mais estáveis.” Escrevendo em 1850, Bastiat observou duas áreas em que os Estados Unidos ficavam ainda aquém do desejável: “A escravatura é uma violação dos direitos da Pessoa aceite pela Lei. O Proteccionismo é uma violação, perpetrada pela Lei, dos direitos de Propriedade.”

Se Bastiat hoje fosse vivo, ficaria desapontado com o nosso fracasso em manter a lei dentro dos seus devidos domínios. Ao longo de um século e meio, criámos mais de 50 000 leis. A maioria delas autoriza o Estado a iniciar a violência perante aqueles que não a iniciaram perante ninguém. Estas leis vão desde leis anti-tabaco em estabelecimentos privados e “contribuições” para a Segurança Social até às leis de licenciamento ou de salário mínimo. Em cada um desses casos, o cidadão que exija e defenda resolutamente o direito que lhe foi concedido por Deus de ser deixado em paz pode, em última instância, ser morto às mãos do nosso governo.[1]

Bastiat explica o clamor por leis que restringem o intercâmbio pacífico e voluntário e punem o desejo de ser deixado em paz, dizendo que os socialistas querem tornar-se Deuses. Os socialistas vêem as pessoas como matérias-primas para diversas combinações sociais. Eles – a elite – “viram entre a Humanidade e o Legislador o mesmo tipo de relação que existe entre o barro e o oleiro.” E é para com as pessoas que têm essa visão que Bastiat exibe a única raiva que encontro n'A Lei, ao atacar os benfeitores e pretensos governantes da humanidade: “Ó miseráveis! Que vos achais tão grandes, que julgais a Humanidade tão pequena, que tudo quereis reformar, reformai-vos vós mesmos, que isso já vos bastaria.”

Bastiat era um otimista que acreditava que argumentos eloquentes em defesa da liberdade poderiam salvar o dia; mas a história não está do seu lado. A história da humanidade é uma história de abuso e de controlo sistemático e arbitrário por parte da elite, agindo no seu interesse privado, através da igreja, mas principalmente através do governo. É uma história trágica onde centenas de milhões de almas infelizes foram massacradas, na sua maioria pelo seu próprio governo. Um historiador que escreva daqui a duzentos ou trezentos anos encarará as liberdades que existiram para uma minúscula parcela da população humana, principalmente no mundo ocidental, e apenas numa pequena parte da sua história, no último século ou dois, como uma curiosidade histórica difícil de explicar. Esse mesmo historiador vai também reparar que essa curiosidade histórica se tratou apenas de um fenómeno temporário e que a humanidade depressa voltou ao seu estado tradicional – o de abuso e controlo arbitrários.

Esperemos que a história venha a refutar essa avaliação pessimista. O colapso mundial da respeitabilidade das ideias do socialismo e do comunismo sugere uma réstea de esperança. Outro sinal esperançoso são as inovações tecnológicas que tornam mais difícil ao governo obter informações e controlar os seus cidadãos. Inovações como o acesso à informação, a comunicação e as transações monetárias eletrónicas tornarão as tentativas governamentais de controlo mais dispendiosas e menos prováveis. Essas inovações tecnológicas tornarão cada vez mais possível aos cidadãos do mundo comunicarem e negociarem uns com os outros sem o conhecimento, sanção ou permissão do governo.

O colapso do comunismo, as inovações tecnológicas, acompanhados por robustas organizações de livre mercado promovendo as ideias de Bastiat, são as coisas mais otimistas que posso dizer sobre o futuro da liberdade nos Estados Unidos. Os americanos partilham um fardo e uma responsabilidade moral espantosos. Se a liberdade morrer nos Estados Unidos, está destinada a morrer em qualquer outro lugar. Uma maior familiaridade com as ideias claras de Bastiat sobre a liberdade seria um passo importante para reacender o respeito e o amor, permitindo a ressurreição do espírito de liberdade entre os nossos compatriotas americanos.

[1] A morte não é a pena estabelecida para a desobediência; contudo, a morte pode ocorrer, se a pessoa se recusar a submeter-se a sanções governamentais pela sua desobediência.

Introdução de Walter E. Williams à edição americana do ensaio A Lei, de Frédéric Bastiat.

Tradução de Carlos Silva e Pedro Almeida Jorge.

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